Para lá dos muros de suas próprias definições, Anná abre os trabalhos de 2025 com o EP Deusa. O projeto é diluído em três atos, como quem entrega capítulos de uma novela mística. Trata-se de um convite à reflexão, mas, ainda assim, sem abrir mão do elemento mais marcante da sua trajetória: sua identidade multifacetada e nada óbvia.
A jornada começa com “Deusé Brasileira”, faixa que conta com a ilustre participação de Dona Neide e composição de Gabriel Muca. A música nos joga direto em uma busca filosófico-mística por sentido. Aqui, o sagrado afro-brasileiro, o cristianismo e as velhas hipocrisias nacionais convivem como velhos conhecidos numa mesa de bar.
“Qual é o preço pra se ter paz / não se compra, nem parcela, nem à vista que se paga / O veio branco que condena com maldade um bocado que não pode mas que todo mundo faz”, canta Anná.
Logo de cara, ela chuta a porta da conveniência com sua poesia cortante.
Nietzsche no batidão
Em seguida, mergulhamos no batidão. A vibe é de funk sintetizado com uma pitada de estoicismo. Porque sim, Anná também filosofa na pista.
“Não vou parar, vou me lançar, tentar de novo dançar / Abri a porta, olhei pro céu, a fé respira / Caguei pra trend, entende o que a vida dá.”
Enquanto enfrentamos crises existenciais e picos de iluminação espiritual, seguimos Anná em sua busca por respostas. A vibe? Um pouco de Buda, um pouco de orixás e um meme da Anitta rezando com incenso — tudo junto e misturado, como de costume.
Logo depois, com “Pipa Voada”, Anná mostra seu lado gospel-nostálgico. É uma releitura ousada de “Eu Era Pipa Voada”, de Márcio do Espírito Santo. Sim, é sobre se perder e se reencontrar lá no alto, com o vento batendo e a fé no improviso.
Por fim, o primeiro ato se despede ao som de “Todo Mundo Tá Ok”. Em seu dia mais bissexual, Anná convida para uma pegação sonora que vai do arrocha atualizado até o forró com carão. Tudo isso com a leveza de quem sabe que a libertação também pode vir em forma de dança colada.
Uma sessão de terapia em forma de EP
Em resumo, Deusa não é apenas um EP — é praticamente uma sessão de terapia coletiva com trilha sonora. Anná nos leva do terreiro à boate, passando pelo desabafo existencial e voltando pra igreja como quem faz baldeação na Sé.
Se isso não for identidade, então talvez a gente precise mesmo de um pouco mais de fé… ou, no mínimo, de um fone de ouvido bom o suficiente pra acompanhar esse rolê transcendental.
Uma crítica é um gênero opinativo que analisa, interpreta e julga uma obra, evento ou produção cultural com base em critérios técnicos e estéticos do autor e não representa, necessariamente, a opinião editorial do veículo
Deusa - EP
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